segunda-feira, 24 de junho de 2013

A alma hipertrofiada


Nos bastidores da revolução...

"O rapaz que aos vinte anos se inscreve no partido comunista ou que, de espingarda na mão, se junta à guerrilha das montanhas, está fascinado pela sua própria imagem de revolucionário: é ela que o distingue de todos os outros, é ela que o faz transformar-se em si próprio. Na origem da sua luta encontra-se um amor exacerbado e insatisfeito pelo seu eu, ao qual ele deseja dar contornos bem nítidos, antes de o enviar (realizando o gesto do desejo de imortalidade, tal como o descrevi) para o grande palco da História sobre o qual convergem milhares de olhares: e nós sabemos já, pelo exemplo de Mychkine e de Nastassia Philippovna, que sob os olhares intensantemente assestados nela a alma não pára de crescer, de inchar, de ganhar volume, para finalmente levantar voo em direção ao firmamento como um aeróstato magnificamente iluminado. 
O que incita as pessoas a erguerem o punho, a pegarem numa espingarda, a defenderem juntas causas justas ou injustas, não é a razão, mas a alma hipertrofiada. É este o carburante sem o qual o motor da História não poderia funcionar e à falta do qual a Europa teria ficado deitada na relva, a olhar preguiçosamente as nuvens que pairam no céu. "

Milan Kundera, A Imortalidade

domingo, 23 de junho de 2013

A Lei do Eterno Retorno



“E se um dia ou uma noite um demônio se esgueirasse em tua mais solitária solidão e te dissesse: “Esta vida, assim como tu vives agora e como a viveste, terás de vivê-la ainda uma vez e ainda inúmeras vezes: e não haverá nela nada de novo, cada dor e cada prazer e cada pensamento e suspiro e tudo o que há de indivisivelmente pequeno e de grande em tua vida há de te retornar, e tudo na mesma ordem e seqüência – e do mesmo modo esta aranha e este luar entre as árvores, e do mesmo modo este instante e eu próprio. A eterna ampulheta da existência será sempre virada outra vez – e tu com ela, poeirinha da poeira!“ Não te lançarias ao chão e rangerias os dentes e amaldiçoarias o demônio que te falasses assim? Ou viveste alguma vez um instante descomunal, em que lhe responderias: “Tu és um deus e nunca ouvi nada mais divino!” Se esse pensamento adquirisse poder sobre ti, assim como tu és, ele te transformaria e talvez te triturasse: a pergunta diante de tudo e de cada coisa: “Quero isto ainda uma vez e inúmeras vezes?” pesaria como o mais pesado dos pesos sobre o teu agir! Ou, então, como terias de ficar de bem contigo e mesmo com a vida, para não desejar nada mais do que essa última, eterna confirmação e chancela?” 

A Gaia Ciência, Nietzsche


Não há outro jeito. Vou me sentar à mesa, vão todos beber e rir e se sentir completos com fumaça nos pulmões e álcool a correr pelas veias. Vão contar histórias infames e arreganhar seus dentes amarelados ao gargalhar, embriagados e regurgitando desaforos. Juro que vou tentar acompanhar, vou forjar um sorriso aqui e ali, mesmo que nada daquilo faça parte de mim. Juro que a todo custo tentarei estuprar minha personalidade até meus limites. A certa hora, meu sono vai tomar conta e eu vou precisar me afastar. Ou não vai ser sono, vai ser fúria mesmo, e todo o teatro vai desabar, a lona do circo vai cair, o fogo vai consumir o que havia ali, e vou seguir tateando em meio à fumaça o caminho de fuga, buscando a linha tênue que ainda me liga ao que é meu. Vou fatidicamente retornar ao meu mundo, onde posso finalmente ser eu. Vou voltar a ser Agnes, a ser Lobo da Estepe, a ser Tamina, a ser Laura, a ser Sidarta, a ser Demian, a ser Sabina, às paisagens só minhas, às músicas mais que repetidas, a esse mundo por tão poucos compartilhado. É dolorido que meu mundo seja outro planeta. Sempre vai ser dolorido e ilegítimo abdicar do meu mundo para tentar fazer parte do mundo dos outros. Posso no mínimo visitá-los, esses tantos planetas mais ou menos iguais e tão estranhos, mas nunca vou habitá-los. Juro que vou daqui em diante procurar planetas em que eu reconheça ao menos uma rua, ao menos uma árvore seca. Que compartilhem com o meu uma paisagem que seja. Mas nesse eterno ciclo torturante de tentar fazer parte, tudo vai e tudo retorna. 
Veja só essa grande farsa que é viver. Por Deus, eu não vou mais mentir para mim.


"Ela não podia nem se atormentar com suas guerras, nem alegrar-se com suas festas, porque estava impregnada pela certeza de que nada disso era problema seu."

A Imortalidade, Milan Kundera




quinta-feira, 13 de junho de 2013

"Come outside, she said, I think I’m leaving tomorrow afternoon, I’m going far away from here. Come outside, she said, come outside with me, put away your fears, you and me were not meant for bedrooms, you and me were not meant for homes, she said, I’m leaving here tomorrow, please come with me darling, I don’t want to go alone. Come outside, she said, climb out your window, come outside, before the world gets any colder, you and I get too much older, come outside, she said, well, come outside, she said, hey climb out your window, come outside before my momma knows I’m gone, your daddy thinks you're home alone, come outside and run away with me, she said, come outside, she said, climb out your window, come outside if you can't get away, find me some other day, if not today, I'll be on my way. You and me weren’t meant for bedrooms, you and me weren’t meant for these small town afternoons, you and me were meant for leaving, we were meant for highways and sunsets and all summer months so come away come away come away come away outside she said and runaway runaway runaway with me"

Trecho desconhecido incluído na versão ao vivo de Round Here, do Counting Crows, de 10/04/2013 na Sydney Opera House 

http://www.youtube.com/watch?NR=1&v=6PMxpdPLm-k&feature=endscreen