Quando
voltei de anos vivendo na parte mais continental dos confins do
lado de lá, eu quis ir pro meio do mar. Que aventura então seria passar dias e
noites olhando o mar de cada escotilha, fizesse chuva ou fizesse sol! Muitos
cursos depois, concordaram que eu seria uma boa marinheira, com a desculpa de
ensinar dois idiomas um tanto enferrujados para a tripulação de um navio, e então
lá fui eu embarcar nessa ideia maluca.
O meu
lugar preferido de lá era o ponto mais alto possível, onde eu subia sempre que
podia para conversar com Deus. Com o ruído alto das máquinas, era mais um sussurro. Via homenzinhos cor de laranja andando lá
embaixo, apressados. Ficava escondida ali, atrás da grande chaminé. No máximo,
tinha a companhia dos pássaros, ou com sorte recebia a visita das baleias,
dançando, exibidas e belas.
E era
paz. Era ilhazinha flutuante cercada de mar e de céu por todos os lados. A
imensidão do mar nos dá a ilusão de que tudo é eterno. Tímidos contornos de
montanhas próximas ao horizonte lembravam que havia mais do que isso no mundo. E
quando chegava a noite, era um abismo sem fim. Mas bastava me acostumar com as luzes
do navio para perceber um peixinho aqui e ali e um céu de um milhão de
estrelas. Ali em cima era solitário, mas era pleno. Era mais um descanso do que
uma tristeza. Ali eu me descobri mar.
E mesmo hoje não estando mais lá, eu ainda sou mar. Graças àquele lugar, hoje eu
carrego no peito um mar infinito cheio de peixinhos e baleias dançantes
sob um céu de um milhão de estrelas pela vida afora. E eu ando querendo mesmo é navegar, fazer
jus a esse nome que me deram me adivinhando.